As operações de outlet já são populares em países maduros e no Brasil há tempo. Nos mercados Norte americano e Europeu houve a proliferação de shopping centers voltados aos outlets a partir da década de 1980. No Brasil, algumas tentativas implantadas na década de 1990 – como os shopping centers SP Market e “D” em São Paulo e o Outlet Campinas - foram posteriormente convertidas em formatos convencionais. Recentemente, a implantação e êxito do Premium Outlet e a perspectiva de novos shoppings voltados a outlets despertou reflexões sobre o potencial para o modelo.
O formato de outlet no varejo constitui um canal complementar, pois é ferramenta para compensação de ineficiências e erros. A sua importância cresce à medida que aumentam “sobras” de produtos que não foram comercializados nos canais convencionais durante seu ciclo de vida e com as margens de vendas almejadas na precificação.
Viabilizadores - as características que levam a uma maior necessidade de outlets na arquitetura de formatos e canais de distribuição são:
• Produtos com ciclos de vida relativamente curtos, elevado nível de renovação de linha e sazonalidade. Isto é o caso de todas as linhas ligadas a moda, mas alcança cada vez mais outras categorias que incorporam a dinâmica da moda e das coleções sazonais em seu desenvolvimento de produtos, como no ramo da decoração, por exemplo;
• Marcas e fabricantes estabelecidos, com distribuição voltada a canais indiretos – lojas multimarca e lojas de departamentos – que impõem processos de vendas e distribuição mais longos, ampliando a margem de erro nas compras;
• Existência de grandes redes de lojas de departamentos multimarcas, que costumam trabalhar com ciclos de compras longos, níveis de estoques elevados, ciclos de remarcações longos e elevados volumes de produtos com pouca capacidade de venda nas lojas convencionais;
• Cadeia de abastecimento descentralizada geograficamente e longos lead times entre o desenvolvimento da linha, a compra do produtos e o ciclo de produção e distribuição. No mercado de moda dos EUA, a maior parte do abastecimento foi direcionada para países de baixo custo – sobretudo sudeste asiático – e os pedidos são feitos entre 6 e 8 meses antes da entrada dos produtos em lojas. Com isso, a margem de erro cresce e o percentual de sobras aumenta;
• Margens elevadas entre o custo de aquisição do produto e o preço de venda no varejo. Isto permite absorver as remarcações necessárias para tornar o outlet atraente, com margens suficientes para absorver operações de baixo custo;
• Escala – redes de outlets justificam-se quando há grandes volumes de produtos, que economicamente não justifiquem a queima nos pontos de venda tradicionais.
Do limão a limonada - outlets geram custos diretos e indiretos, envolvendo montagem da loja, pessoal, manutenção além de controle, supervisão, gestão de produtos e abastecimento. As redes estabelecidas tratam o outlet como canal e até mesmo unidade de negócios. Nos EUA e na Europa há desenvolvimento de linhas de produtos específicas para abastecer as redes de outlets, visando garantir uma oferta minimamente estruturada e atraente, disponibilidade de tamanhos e aumento de margens brutas. Com isso, muitas operações de outlet apresentam elevada rentabilidade, o que impõe grande disciplina na dosagem de sua expansão, para não criar canibalização com os canais que vendem a preço cheio.
A realidade brasileira – a aderência do outlet como canal relevante para distribuição no Brasil é limitada. Em relação aos pontos anteriormente apontados como viabilizadores:
• O país ainda possui uma cadeia de produção completa nos segmentos ligados a moda, o que reduz o lead time entre desenvolvimento, compra e distribuição dos produtos. Não há a eficiência e agilidade do fast fashion europeu, porém, há vantagens em relação ao modelo norte-americano;
• O elevado custo financeiro, somado à histórica restrição das empresas a fontes de financiamento, criaram no Brasil uma cultura de giro mais intensa que a dos EUA. Os níveis médios de estoques no varejo de moda brasileiro são inferiores aos das redes americanas, particularmente em comparação com as lojas de departamentos convencionais como Macys, Saks, Bloomingdale’s e JC Penney;
• O varejo controla as marcas. A predominância de marcas de varejo leva a um controle sobre o produto e a produção, com encurtamento nos ciclos de compras e distribuição;
• Ausência de lojas de departamentos convencionais – o formato de grande loja de departamentos multimarcas deixou de existir no Brasil, o que o torna uma exceção em comparação a outros mercados maduros e emergentes. No México, Chile, Argentina e Peru encontram-se Palacio de Hierro, Falabella, Almacenes Paris, que possuem formatos similares a Macys, Sears, El Corte Inglés, Kaufhof, Lord & Taylor, Galeries Lafayette e Coin, nos EUA e Europa. As chamadas “lojas de departamentos” brasileiras, como C&A, Renner, Riachuelo e Marisa aproximam-se do modelo europeu de grande superfície especializada monomarca, como Zara, H&M e Oviesse;
• A escala ainda limitada das redes de varejo nacionais não gera volumes significativos de produtos que justifiquem a criação de canais dedicados a sua venda. A maior rede de varejo de vestuário do Brasil – C&A, não chega a 200 lojas, apesar de estar desde a década de 70 no país. A maior rede em pontos de venda – a Hering – opera cerca de 350 lojas, para um território com 5.565 municípios.
De outro lado, expansão acelerada das redes, aumento de escala, abrangência geográfica e número de pontos de venda tentem a aumentar os volumes de saldos e demandar eventuais alternativas para sua venda. O aumento de custos de ocupação em lojas leva à necessidade de renovação de estoques e limitação de períodos e percentual da linha remarcada. Com isso, cria-se a necessidade de tirar mais rapidamente saldos e produtos remarcados, que devem ter outro destino para sua venda. Historicamente, as empresas recorreram a bazares, vendas temporárias, lojas de fábrica e alguns outlets permanentes, normalmente próximos à matriz.
O desejável é que o varejo trabalhe com processos integrados de planejamento, compras, distribuição e vendas; boa gestão de ciclo de vida de produtos e de remarcações; integração de processos com os fornecedores e capacidade de liquidar estoques em suas lojas. Haverá espaço para implantação de lojas outlet e até para surgimento de novos e bem sucedidos shopping centers voltados ao formato, mas dificilmente eles se tornarão uma realidade equivalente à do mercado norte-americano.
* Alberto Serrentino é Sócio sênior da GS&MD - Gouvêa de Souza.
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